Pela janelas chegam os sons desconexos dos tambores e das campainhas, que acompanham o desfilar dos andores que contornam os templos da Durbar Square. É o festival Dasain, o mais importante do calendário religioso hindu, mas que estende as suas celebrações aos outros grupos étnicos e religiosos do Nepal, sendo celebrado por todo o país.
Dura quinze dias, começando na lua-nova de Outubro e terminado na lua-cheia, sendo os sétimo, oitavo, nono e décimo dias os mais intensos, crescendo o numero de visitantes nos templos assim como a devoção na realização dos pujas; o comércio e os serviços encerram, nas ruas desfilam pessoas em traje “domingueiro” e estreando roupa nova, os autocarros enchem-se com os que visitam familiares e amigos, recebendo dos mais velhos o tika, marca feita na testa, com uma pasta preparada pelas mulheres, à base de pigmento vermelho, iogurte e arroz cozido,
Esta cerimónia realizada a nível doméstico, tanto pelas mulheres como pelos homens, inclui também a oferta de uma quantia simbólica de dinheiro, em papel e moedas, uma banana, um pedaço de coco, um pequeno ramo de ervas acompanhado de uma fita vermelha que é colocada à volta do pescoço, tudo isto simbolizando a abundância e a prosperidade.
São oferecidos aos convidados bebidas e carne, que é servida como prasad, comida abençoada pelos deuses, que resultou dos animais, búfalos, cabras, patos e galos, que foram sacrificados nos dias anteriores, para com o seu sangue abençoar, casas, ferramentas, motas, carros e máquinas em geral, acreditando-se assim evitar acidentes.
Apesar hindus, o consumo de carne durante o festival Dasain é aceite como forma de acalmar a deusa Durga, simbolizando a batalha em que a deusa mata o demónio Mahishasura, livrando a humanidade do terror, impondo a verdade, justiça e virtude, sendo o décimo dia celebrada a definitiva vitória de Durga.
Estes sacrifícios animais, frequentemente realizados junto aos templos de Durga e Kali, estão a ser gradualmente substituídos por oferendas de frutos, de forma a poupar os animais, pois o sacrifício de animais não se encontra previsto em nenhum dos textos sagrados hindus, resultando provavelmente de uma fusão das práticas religiosas anteriores à chegada das religiões praticadas actualmente no Nepal: hindu, budista e muçulmana.
O vermelho que enche o olhar durante todos os dias em que decorre o festival, em especial no décimo, nos sahrees das mulheres, nos panos que cobrem as imagens, na cor do tika, nas fitas vermelhas que enfeitam os altares e nas que se colocam ao pescoço, é sinal de prosperidade, simbolizando também os laços de sangue que unem os elementos da mesma família, que num país como o Nepal, em que toda a estrutura social e económica se baseia nos laços de sangue e na casta, é fundamental à integração de um individuo.







Por todo o lado, em especial nos últimos dias do festival vêm-se pessoas ostentando um pequeno punhado de ervas, geralmente presas na orelha, na roupa ou no cabelo, que foram oferecidas durante a cerimónia do tika. Trata-se de um ritual realizado pelas mulheres que plantam no primeiro dia do festival, na lua-nova, sementes de cevada num pote com água e dejectos de vaca, que é abençoado por um sacerdote num templo. Durante os dez dias seguintes este pote, o kalasha, é mantido no interior da casa, longe da luz, sendo venerado duas vezes ao dia geralmente pelo elemento masculino da família. No décimo dia do festival, os rebentos são cortados e para além de utilizados na cerimónia do tika, são também colocados à entrada das casas, juntamente com outras oferendas como arroz, frutos e flores, sendo por vezes acompanhada de uma pequena lamparina que arde em ghee, conferindo ao ar das ruas estreitas de Kathmandu um aroma particular.
Durante o Dasain, crianças reúnem-se durante o dia nas praças e nos terraços dos prédios, para lançarem papagaios feitos de finos pedaços de bambu que forrados com plásticos coloridos se elevam tão alto no céu de Kathmandu que se deixam praticamente de ver. Durante estes dias são construídos, um pouco por todos as povoações, baloiços feitos com grossos tronco de bambo, que servem de diversão à crianças, avistando-se ao longe pela sua altura, que ultrapassa as construções mais modestas.


