Qualquer percurso de autocarro no Nepal é por si uma viagem.
Num país que somente nos anos 50 começou a abrir as suas fronteiras ao estrangeiros, e onde até então Kathmandu permanecia acessível somente a pé, onde não existe via férrea, as únicas formas de viajar pelo Nepal são de avião ou as estrada que gradualmente têm sido construídas e que cobrem praticamente todo o território.
O avião que é a opção preferida pelos turistas, não só pela rapidez associada ao reduzido custo, mas especialmente para evitar as longas e sinuosas estradas que atravessam as montanhas e que invariavelmente se encontram ao mau estado, com lombas, buracos e por vezes com zonas praticamente sem pavimento, onde cada monção arrasta consigo parte do esforço despendido na construção de novas vias e na manutenção das existentes, e que dados os fracos recursos económicos do país são difíceis de recuperar.
Contudo os autocarros são a forma mais barata de viajar, para quem tem tempo para apreciar o colorido e a agitação de uma destas viagens, em autocarros degradados pelos anos e pelo estado das estadas, mas onde se nota um cuidado muito particular na sua manutenção, não só pelas sucessivas camadas da colorida pintura exterior realçadas pelos elaborados desenhos de “Shiva” como na decoração com fitas de aplicações metálicas que tornam cada veículo diferente de todos os outros.
O interior é também por vezes uma verdadeira obra-de-arte, com painéis coloridos a revestirem o tecto e as paredes do veículo, e coloridos panos cobrindo os assentos que por vezes se encontram partidos ou substituídos por bancos que deve ter pertencido a outro veículo. A música é uma constante em todas as viagens, sendo debitada pelo improvisado sistema de som que cada autocarro tem.
Em todos os autocarros, tanto os que circulam em meio urbano como os de longo curso, para além do condutor existe o cobrador de bilhetes, que acumula com a função de arrumar a diversificada bagagem que é transportada tanto no interior como no exterior do veículo; tem um papel importante na angariação de “clientes”, saindo em cada paragem e gritando pela rua o destino do autocarro, e dando pancadas com a mão no exterior do veículo para indicar ao motorista que ainda tem que esperar por mais algum passageiro atrasado que se apressa a correr para o autocarro.
Provocam um frenesim cada vez que chegam a uma paragem, mas são uma grande ajuda para saber qual o autocarro certo para o nosso destino e para nos indicarem ao local onde queremos sair, especialmente num país onde poucas indicações existem em caracteres ocidentais, incluindo a numeração que usa frequentemente os caracteres nepaleses.
Encontrar uma paragem de autocarro também não é tarefa fácil, pois, com excepção de algumas zonas dentro das cidades e ao longo das principais estradas, não existe qualquer indicação quanto ao local de paragem. A solução é perguntar aos solícitos habitantes que prontamente nos indicam o local, onde geralmente se encontram outras pessoas já à espera. Não há horários certos, iniciando-se a viagem geralmente quando o autocarro está cheio ou quase; pára-se se o motorista quer ir comer alguma coisa ou cumprimentar alguém… e pára-se muitas vezes… Esta ausência de paragens proporciona a entrada e saída do autocarro em praticamente todo o lado, o que torna alguns curtos percursos numa longa viagem, tornando imprevisível a hora de chegada ao destino.
Num país onde o transporte individual é raro, o autocarro serve para transportar de tudo; é preciso arranjar espaço, num veículo já cheio para uma mulher que entra carregando o seu cesto de bambu, com produtos para vender nos mercados, entram sacas de arroz, bilhas de gás… no tejadilho vão uns móveis e mais sacas, umas cabras, que de inicio protestam ao serem içadas mas que permanecem sossegadas o resto do caminho…
Para além dos autocarros, os camiões de mercadorias são também uma presença constante nas estradas, provocando longas filas nas íngremes subidas das estradas de montanha, onde estes veículos acusam o peso da idade, mas cuja decoração é orgulho dos motoristas, com desenhos de deuses hindus e de outra simbologia religiosa, fazendo com que cada veículo seja diferente.