Manali foi somente uma paragem intermédia para chegar-mos ao nosso destino: Leh, na região de Ladakh, no estado de Jammu e Kashmir, o mais a norte da Índia.
Inicialmente tínhamos planos de ir para o vale de Spiti, ainda no estado de Himachal Pradesh, próximo da fronteira com o Tibete, mas como a estrada ainda não estava aberta devido à neve, optámos por seguir directamente para Leh, cuja estrada tinha aberto uns dias antes.
A geralmente designada Manali-Leh Highway, é a segunda estrada mais alta do mundo, chegando aos 5328 metros de altitude o que juntamente com as condições climatéricas durante o Inverno, com temperaturas abaixo dos 20ºC negativos, fazem com que esta estrada somente esteja aberta de 15 de Junho a 15 de Setembro, altura em que circulam os autocarros públicos, que fazem esta viagem em dois dias.
Contudo, assim que as condições da estrada o permitem inicia-se a circulação automóvel, tanto para veículos pesados como para veículos turísticos, como jeeps e mini-bus. Optámos pela solução mais económica, o mini-bus com capacidade para doze pessoas, que nos custou 2200 rupias por pessoa, cerca de 31€.
De salientar que o termo “highway” não deve ser traduzido como auto-estrada, pois as velocidades praticadas, as características da traçado e as condições de segurança nada têm a ver com o que conhecemos com esta designação; deve sim ser entendido literalmente como estrada a grande altitude.
Os 485 quilómetros de viagem estavam previstos serem feitos em 17 horas, com saída de Manali às 2 horas da manhã, mas o estado da estrada, a condução cuidadosa do motorista, juntamente com algumas paragens para comer e descansar, fizeram com que somente chegássemos a Leh pelas 11 da noite, completando assim 21 horas de viagem. Deste tempo todo temos que descontar uma hora em que andámos às voltas em Manali, passando por vários rebanhos de cabras e de ovelhas que aquela hora aproveitava as estradas desertas para se encaminharem para pastagens mais altas, para recolher juntos dos vários hotéis e guesthouses os restantes passageiros: indianos, israelitas, venezuelanos e um alemão.
Foi a mais longa viagem que alguma vez fiz por meios terrestres, mas foi de longe a mais bonita, impressionante e memorável de todas. É de uma beleza indescritível e não encontro palavras para transmitir as emoções que me despertou. Nem tão pouco as fotografias fazem justiça ao que vimos, de qualquer das formas colocamos algumas, muitas delas tiradas do autocarro em andamento, o que justifica a má qualidade.
O estado da estrada é bastante mau, não só pelo seu traçado sinuoso que percorre muitas das vezes as encostas das montanhas num ziz-zag, como pelo estado do pavimento, quase todo em terra e com muitas pedras soltas, atravessado frequentemente por linhas de água que escorrem dos maciços de neve, o que provocou um constante e cansativo balançar durante toda a viagem.
A viagem iniciou-se ainda de noite, mas à medida que íamos subindo as montanhas que se encontram a norte de Manali, o céu ia clareando o que permitiu ver que para trás tinham ficado as densas florestas de cedros que caracterizam a região de Kullu, tendo-se a paisagem tornando mais árida, rochosa e com muitas zonas cobertas de neve, que chegava a ultrapassar em altura a janela do autocarro.
Parámos na povoação de Koksar que não é mais do que um conjunto de construções aninhadas um vale desértico, que servem de apoio aos camionistas e demais viajantes que percorrem estas paragens, que consistem basicamente em dormitórios e restaurantes.
Quando cruzámos o passo de Rothang, a paisagem mudou radicalmente, tornando-se completamente árida e cinzenta, sem vegetação.
As horas foram passando, subindo montanhas até aos pontos mais acessíveis para cruzar cordilheiras, descendo encostas até às zonas baixas onde se encontram as pontes metálicas, em mau estado, que permitem atravessar os principais rios, e percorrendo desfiladeiros escavados ao longo de milhares de anos por linhas de água formadas pelo degelo.
À medida que avançávamos as cores das encostas montanhosas iam variando entre os vários tons de cinzentos, ocres e muitos cambiantes de castanhos, que contrastavam com o intenso azul do céu, sempre limpo, sem uma única nuvem. Contudo a temperatura era baixa, em especial quando subíamos aos pontos mais altos, mas o sol aquecia o suficiente para não tornar o ambiente demasiado frio.
As montanhas particamente despidas de vegetação criavam um ambiente inóspito onde aparentemente não poderia existir vida, mas mesmo assim, avistámos algumas aves de pequeno porte, uma lontra e um antílope, para além de alguns burros selvagens.
O cansaço era grande mas mesmo assim tentei manter-me acordada durante toda a viagem tal era o efeito magnético que me despertava a paisagem que me rodeava, contudo o sono venceu-me por alguns momentos, mesmo com todos os abanões e solavancos do autocarro e do som estridente da música indiana que o motorista ouviu durante toda a viagem para se manter desperto.
Circulámos devagar e com frequentes paragens sempre que tínhamos que nos cruzar com algum veículo, pois a estrada apresenta zonas muito estreitas e outras ainda ocupada pela neve, ou para atravessar alguma linha de água que cruzava a estrada.
Passámos por diversos grupos de pessoas, que se encontravam a trabalhar em algumas obras de manutenção e de melhoramento da estrada, partindo e empilhando pedras, com recurso a ferramentas rudimentares, sem a ajuda de qualquer tipo de maquinaria. Os seus rostos com lábios grosso e narizes largos, eram escuros e com a pele ferida pelo sol, apesar dos lenços que alguns debilmente tinham enrolados à volta da cara para se protegerem do pó da estrada. As suas roupas eram velhas e sujas, os seus corpos pequenos e magros. À medida que o autocarro passava, estes homens e mulheres fitavam-nos, com o seu olhar vazio e indiferente. No meio de toda a beleza da paisagem, esta pobreza trouxe de volta a realidade das condições em que ainda vive grande parte da população deste país.
Fizemos nova paragem em Pang, um conjunto de tendas que servem refeições e vendem bolachas e chocolates, situada próximo de uma base militar, a segunda que encontramos durante a viagem e que destoam completamente da paisagem com os edifícios pintados com o habitual padrão camuflado verde, quanto tudo à volta é dominado pelo castanho e cinzento.
Com o aproximar do fim do dia atravessámos uma vasta zona, completamente plana entre duas cordilheiras de montanhas, onde avistámos alguns acampamentos de nómadas com as suas tendas circulares, que percorrem estas paragens durante os meses de verão conduzindo rebanhos de centenas de ovelhas e cabras em busca do escasso e rasteiro pasto que rompe o árido solo à medida que o gelo recua.
O deslocar dos rebanho fazia levantar nuvens de poeira que na sua lenta subida em direção ao céu eram atravessadas pelos raios de sol que diminuírem de intensidade antes de desaparecerem por trás das montanhas e roubarem as cores à paisagem.
Tivemos ultima paragem em Upshi, para jantar, mas o cansaço juntamente com a falta de propostas apetecíveis, fez com que não comesse-mos nada. Enquanto esperávamos o motorista foi tratar do controle dos passaportes junto da policia.
Eis uma lista com o itinerário entre Manali e Leh, onde os passos (pontos altos) entre cordilheiras estão assinalados com um asterisco.
km | Localização | Altitude |
0 | Manali | 1896 m |
51 |
Rothang (*) |
3980 m |
71 |
Koksar |
– |
107 |
Tandi |
2573 m |
113 |
Keylong |
3349 m |
145 |
Darcha |
3400 m |
– |
Zingzing Bar |
4320 m |
186 |
Baralacha (*) |
4892 m |
222 |
Sarchu Serai |
4253 m |
276 |
Lachulang (*) |
5019 m |
299 |
Pang |
4500 m |
364 |
Tanglang (*) |
5360 m |
424 |
Upshi |
3384 m |
485 |
Leh |
3505 m |




































Este é o link para um pequeno filme que fizemos durante a viagem de autocarro: